Os brasileiros preferem pagar em dinheiro?
Embora a tecnologia tenha favorecido o aparecimento de novas formas de pagamento — como cartão de crédito e PIX — é pagando em espécie que o brasileiro mais gosta de quitar as suas despesas. É isso que comprova uma pesquisa realizada pela Fundação Dom Cabral (FDC), que apurou que mais da metade da população se sente mais segura para pagar em dinheiro.
Alguns podem questionar de onde viria essa preferência. A verdade é que esse meio de fazer negócios e quitar transações é histórico na cultura brasileira. Infelizmente, isso também tem a ver com outra característica: a de não saber lidar com ele. Ao fim de 2021, houve um recorde no número de famílias endividadas.
De acordo com a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o índice chegou a 76%. Naturalmente a pandemia, a inflação, os juros elevados e o desemprego contribuíram para isso, mas principalmente com a cultura de gastar além do que se tem.
Quer entender sobre como essa relação tem mudado nos últimos anos? Acompanhe os próximos tópicos.
Qual é a preferência do brasileiro na hora de realizar um pagamento?
Enquanto alguns países como Suécia e China caminham para extinguir o dinheiro físico, no Brasil, usá-lo para fazer pagamentos é a preferência do brasileiro. É por isso que, em parte, no início do mês, as filas das lotéricas são quilométricas. Ao usar suas cédulas, ele sente que a transação foi feita com segurança, que a conta está paga e que ainda está contribuindo para que a moeda circule, favorecendo a economia.
Além do estudo da FDC, outro ainda mais específico, desenvolvido pelo Banco Central, considerou que, mesmo podendo utilizar outro meio, 96,1% dos brasileiros usam e dão preferência ao dinheiro vivo para fazer suas compras ou pagamentos.
Parte disso também se deve ao fato de que milhares de pessoas ainda recebem seus salários em dinheiro. Para alguns, isso pode soar arcaico, mas a realidade é que diversas empresas — em especial as que não são regularizadas e não pagam impostos — fazem esse tipo de transação.
Ainda que pagar em espécie seja o jeito preferido de quitar, tem gente que só faz isso quando a conta é pequena (até R$ 10, por exemplo). A mesma pesquisa identificou que, quanto menor a despesa, maior a chance de o estabelecimento receber à vista. Quando a conta é maior (embora isso seja relativo), boa parte opta por pagar com o cartão de crédito.
Por que o pagamento em dinheiro é algo tão relevante?
Há diversas respostas para essa pergunta. A primeira que vamos discutir é o fato de que 99% dos estabelecimentos comerciais aceitam (talvez até prefiram) essa modalidade de pagamento.
Ao mesmo tempo que é seguro para quem paga, também é mais relevante e seguro para o empreendedor que recebe, do outro lado. Eventualmente há armadilhas envolvidas nessa transação, mas é possível escapar delas estando atento a algumas particularidades que vamos pontuar ainda nesse artigo.
Além desse benefício para vendedor e comprador, é uma vantagem para a sociedade e a economia também. A movimentação de moedas, sejam em cédulas ou não, é positiva para o setor financeiro. Em épocas atípicas, como em 2020, quando teve início a pandemia, a distribuição do dinheiro é ainda mais importante. E, surpreendentemente, foi o que aconteceu durante o auge do isolamento social, no começo do ano em questão.
No período de fevereiro a abril, o percentual de dinheiro disponível em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) subiu de 8% para 24%. A mudança não se limitou ao Brasil. Países como Estados Unidos, Canadá e Austrália passaram pelo mesmo processo.
Naturalmente, em relação ao nosso país, pode-se destacar a importância que o auxílio emergencial teve para que isso acontecesse, contribuindo para uma notável movimentação econômica.
Quais são as vantagens de pagar em dinheiro?
Já houve algum produto ou serviço que você quis adquirir e notou diferença no preço à vista e parcelado? Sabia que essa prática é comum e até amparada pela Lei? Veja a seguir algumas vantagens de usar o dinheiro.
Gastar menos
É Lei. Desde 2017, os comerciantes ganharam o direito de poder exigir mais em uma compra que seja paga com cartão de crédito ou débito. Sabe aquela televisão de 50 polegadas que, à vista, custa R$ 2.000 e, a prazo, custa R$ 500 a mais? Não se trata de uma prática abusiva, embora, antes do ano relatado, muitos empreendedores já usassem a tática de oferecer um desconto ao receber em espécie.
A Lei 13.455/17 foi sancionada pelo então presidente Michel Temer. A única ressalva que faz é obrigar o fornecedor a informar, em um local que seja visível ao comprador, quais são os descontos condicionados à forma de pagamento. Se isso não ocorrer, o consumidor pode fazer valer seu direito, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor.
Ampla aceitação
Conforme relatado antes, a maioria dos estabelecimentos comerciais aceitam essa modalidade de pagamento. Portanto, mesmo em uma viagem, você não vai precisar se preocupar se, ao parar em um posto de combustível, por exemplo, seu dinheiro será aceito ou não.
A mesma afirmação não se pode fazer dos cartões de crédito. Além da dúvida se a bandeira do seu é aceita — já que uma parte dos locais aceita apenas as bandeiras principais — ainda tem a chance de ocorrer outros imprevistos, como a falta de sinal de internet ou bateria da máquina, recusa do cartão etc. Para evitar esses e outros aborrecimentos, bem melhor andar com dinheiro na carteira, não é?
Controle financeiro
Comprar é bom demais — e isso já foi até provado. Segundo um estudo divulgado na revista científica Psychology and Marketing, fazer uma compra por impulso melhora tanto o humor que a sensação causada no cérebro é equivalente a que um usuário de drogas sente. Mas, assim como a dependência química, ter esse tipo de hábito pode ocasionar sérias consequências.
Uma das formas de evitar comprar por impulso é pagar à vista. Quando se precisa usar o dinheiro no momento da compra, o consumidor pensa 2, 3 vezes antes de finalizar seu pedido. Muitas vezes, é essa reflexão que o impede de ir adiante, economizando o tão suado dinheirinho.
Em geral, nos manuais de educação e planejamento financeiro, uma das dicas mais citadas é essa: pagar à vista. Porque assim, percebe-se instantaneamente o impacto da compra, voltando a atenção (e a carteira) para gastos menos supérfluos e mais necessários. Quando se compra pelo cartão, a despesa vai para fatura, e só se lembra dela quando chega o dia do temido vencimento.
Como a cultura influencia na forma de fazer pagamentos e lidar com dinheiro?
A forma que vivemos é impactada pela cultura do lugar onde residimos. Uma maneira de diferenciar isso no Brasil tem a ver com a forma de fazer pagamentos. Na década de 90, passamos por um momento frágil na economia, no qual a inflação era altíssima e instável, o que fazia com que as pessoas se sentissem constantemente inseguras em relação às próprias finanças.
Naquela época, cartão de crédito não era só uma novidade, era um privilégio de poucos. Pagar em dinheiro era a única alternativa. Com a virada do milênio, mudaram também os estímulos. Se anos antes, o foco era segurar e poupar, o apelo mudou para gastar e comprar, incentivando a aquisição de cada vez mais bens.
Os cartões foram ganhando mais espaço na vida (e na carteira) dos brasileiros, porém o pagamento em espécie seguiu sendo a maneira mais escolhida para quitar as despesas. Por outro lado, as finanças do brasileiro são vistas de forma sensível pela maioria, quando não como um tabu.
Uma pesquisa feita pelo Itaú, em parceria com o Datafolha, coletou algumas informações interessantes em relação a isso. Entre os mais de 2 mil entrevistados, metade evita pensar em dinheiro, porque isso lhe traz tristeza. Outra parte relevante (60%) não gosta de falar quanto ganha, e até mente a respeito.
O mesmo estudo — que foi realizado após o começo da pandemia — revelou que 81% das pessoas acreditavam que o país se recuperaria financeiramente nos próximos 5 anos, embora não se prolongassem explicando como ou por quê. Isso demonstra uma das características pela qual o brasileiro mais é lembrado no exterior: seu otimismo (que, para alguns, também soa como ingenuidade).
Em resumo, é como se nós estivéssemos habituados com uma economia variável e a crença de que o futuro traria dias melhores fosse superior a qualquer eventualidade, como uma pandemia, por exemplo. Ao mesmo tempo que isso preocupa, por não se apoiar em medidas efetivas e práticas não deixa de ser uma forma de encarar a situação com mais leveza e esperança.
Vale a pena pagar em dinheiro?
Depende. Há situações em que é, sim, mais vantajoso usar o cartão de crédito. Vamos trazer dois exemplos para contextualizar cada uma delas.
Quando é melhor pagar em dinheiro
Supondo que você vai comprar um notebook que custa R$ 5.000 reais. Se optar por paga-lo à vista, ganha um desconto de 10%, e a conta diminui para R$ 4.500. Caso deseje parcelar, serão 10 vezes de R$ 500. Em outras palavras, o valor total se trata do valor à vista (R$ 4.500) somado a R$ 500, de juros, que vai sendo pago durante 10 meses.
Para saber quanto esse valor é representado em juros percentuais, é preciso dividir o total de juros pelo valor total à vista, e multiplicar o resultado da equação por 100. Assim: 500 / 4500 * 100 = 11,11%. O que vai definir se compensa pagar em dinheiro nesse caso é a taxa básica de juros do país. Se ela for inferior a 11,11% (levando o exemplo em consideração), vale a pena fazer o pagamento à vista.
Quando é melhor pagar no cartão de crédito
Considere agora que vai fazer uma viagem que custa R$ 10 mil reais e tem a opção de parcelá-la em até 18 vezes. Se optar por pagar em dinheiro, ganha um desconto de 3%, o equivalente a R$ 300. Será que vale a pena pagar à vista?
Nesse caso não. Apesar do valor do desconto em dinheiro soar razoável, a taxa de juros é de 0,32% ao mês (caso não seja dada nenhuma quantia de entrada) e 0,37% (caso a primeira parcela seja dada no ato da compra). Os valores são baixos demais e não renderiam se comparados a outras aplicações, portanto, a melhor alternativa seria parcelar a compra.
Andar com dinheiro na carteira é seguro?
Segurança é um assunto delicado no Brasil. Parte das pessoas que optam por outras formas de fazer pagamentos não o fazem apenas pela facilidade, mas também por se sentirem mais seguras por não portar o dinheiro em si. Por outro lado, o mesmo pagamento em dinheiro também representa um meio mais seguro de pagar, para outros. Então como saber se é seguro andar com dinheiro na carteira?
A verdade é que, por ser a principal forma de pagamento, vale a pena andar, sim. Mas, calma! Não precisa ser uma quantia alta. Se você não se sente seguro, o ideal é que, como precaução, carregue algumas cédulas na bolsa ou na carteira. Para saber o valor ideal, pense no quanto costuma gastar ao sair de casa: seja para comer algo na rua, para se locomover ou para fazer uma compra simples na farmácia.
Como já dissemos, pagar em dinheiro é abrir mão de se preocupar se o estabelecimento vai aceitar essa modalidade de pagamento, bem como ganhar a possibilidade de negociar e pagar um valor mais vantajoso e atrativo para você. Afinal, quem não gosta de desconto?
Os cuidados a se tomar, ao carregar dinheiro por aí, são os mesmos que se teria ao portar qualquer objeto de valor: procure ficar atento em relação aos seus pertences, especialmente em lugares públicos, como praças e transportes públicos, e, se possível, guarde-o em bolsos ou divisórias diferentes, evitando colocá-lo em um único lugar.
Dinheiro em espécie ajuda a gastar menos?
Em novembro do ano passado, foi registrado o maior valor da história em dívidas no rotativo do cartão de crédito, que é a parte da fatura que não é paga no mês vigente, passando para o seguinte. O montante é de inacreditáveis R$ 48,5 bilhões.
Inadimplência não é novidade no Brasil. Esse ano foi registrado o maior índice desde 2010: 76,6% das famílias — ou seja, ¾ da população do país — estão endividadas, 10% a mais que o mesmo período registrado em 2021. Dívidas em cheque pré-datado, cartão de crédito, crédito consignado e prestação de carro e casa são os campeões de inadimplência.
Tudo isso para reforçar que, sim, pagar em dinheiro e limitar os gastos nos cartões de crédito (ou em outras modalidades como as citadas no parágrafo anterior) ajudam e muito a diminuir ou evitar dívidas, principalmente ao se considerar que os juros de cartão de crédito são os maiores do mercado.
Para se ter uma ideia, ao dever R$ 1.000 para uma operadora de cartão, esse valor se transforma em R$ 4.461 um ano depois (com juros de 346,1%, de novembro/21, de acordo com o Banco Central). Em outras palavras, não é com esse tipo de instituição que você vai gostar de contrair uma dívida.
Quando se limitam as despesas ao pagamento em dinheiro, se você não tiver, você não gasta. É simples. A impossibilidade de usar cartão de crédito ou débito vai trazer mais consciência financeira, permitindo um novo olhar sobre as finanças e sua relevância para outras áreas da vida.
Como reconhecer uma nota falsa?
Uma das principais preocupações de quem carrega dinheiro na bolsa ou na carteira é: “e se me derem uma nota falsa?”, “Como vou reconhece-la?”. Felizmente, durante as etapas de produção do dinheiro, o Banco Central criou alguns elementos de segurança para garantir que não só eles, como quaisquer pessoas estejam aptas a identificar e reconhecer quando uma cédula não é verdadeira.
Você sabe como distinguir? Se não souber, agora vai descobrir!
Família do real
O primeiro passo é saber a qual família pertence a cédula. Sim, são duas famílias do Real. A primeira é composta pelas mais antigas, que ainda estão circulando, porém estão sendo substituídas. A segunda, naturalmente, é composta pelas mais recentes, fabricadas a partir de 2010, como a de R$ 200.
Levando isso em conta, para saber quando uma nota da segunda família é verdadeira, você deve reparar em alguns pontos.
Marca d’água na primeira família
Sabe aquele gesto de colocar a cédula contra a luz? Ele serve para ver o animal e o número do valor da nota em tons que variam do claro para o escuro. Esse detalhe não existe numa nota falsificada.
Alto-relevo
Essa é fácil. Repare se a cédula tem algumas regiões em alto-relevo, ou seja, se destacam sob o toque. Um exemplo disso é a legenda “República Federativa do Brasil”.
Número escondido
Estando em um local iluminado e colocando a nota na altura dos olhos, na horizontal, dá para ver o valor da cédula destacado.
Faixa holográfica
Movimentando essas cédulas, dá para perceber a figura do animal ficando colorida, as cores em movimento (na nota de R$ 50 e na de R$ 100), e o número da nota e a palavra reais se alternando.
Número que muda de cor
Nas notas de R$ 10 e R$ 20, uma faixa brilhante rola pelos números das cédulas. Quando movimentadas, o número muda de azul para verde.
Marca d´água na segunda família
A diferença aqui, da segunda para a primeira família, é que, nesse caso, as cédulas antigas apresentam diversas figuras quando colocadas contra a luz. Nas de R$ 5 e R$ 10, por exemplo, aparece a bandeira nacional, enquanto nas de R$ 50 e R$ 100, aparece a efígie da República.
Imagem latente
No canto esquerdo inferior vai aparecer a sigla BC (Banco Central) quando a cédula estiver na horizontal.
Alto-relevo
Algumas regiões das cédulas são mais sensíveis ao toque, como o nome Banco e os números que marcam o valor dela.
Registro coincidente
Segurando a nota contra a luz, dá para ver o desenho das Armas Nacionais, que ficam do lado direito.
Caso receba ou identifique uma nota falsa em alguma transação financeira, o procedimento recomendado é leva-la a qualquer agência bancária. Lá eles vão coletar seus dados e contato e, em seguida, encaminhar o material para análise do Banco Central. Se for provado que ela é legítima, você será reembolsado.
É importante mencionar que, se alguém colocar uma cédula falsa em circulação, conhecendo sua natureza, pode ser incriminado, ainda que não tenha sido o responsável pela falsificação. A punição é de 6 a 24 meses de detenção.
O dinheiro em espécie vai acabar?
Mesmo com métodos mais tecnológicos avançando rapidamente — como o PIX e as carteiras digitais — é seguro afirmar que o dinheiro físico, como conhecemos, não vai acabar tão cedo. Isso se deve, principalmente, a questões relacionadas à infraestrutura, renda e comportamento, que, naturalmente, são divergentes, variando de acordo com a região, faixa etária, sexo etc.
Para se ter uma ideia, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, divulgada no primeiro semestre de 2020, um em cada quatro brasileiros não tem acesso à internet. Isso significa que mais de 45 milhões de pessoas não tem como fazer transações financeiras online — e nem mencionamos ainda as áreas rurais.
Então, mesmo que já tenha existido, inclusive, uma proposta para que o processo de como é produzido o dinheiro acabasse, é preciso entender a complexidade da situação e a relevância do pagamento em dinheiro para uma parcela significativa da população, que sequer conhece ou tem acesso a outra modalidade.
A extinção do dinheiro físico é considerada desde a década de 50, quando estudiosos do assunto já mencionavam os cartões de crédito, e é inegável que as novas gerações o usam com menos frequência, mas é cedo demais para concluir que ele vai chegar ao fim — seja nos próximos 10 ou 100 anos.
Para o consumidor, é essencial que exista diversos meios de pagamento, afinal, dessa forma, ele tem poder de escolha para optar pelo que é melhor para si, em cada caso. Para pagar em dinheiro ou em outra moeda são práticas que podem coexistir, sem que um precise eliminar o outra.
Está a fim de entender mais sobre liberdade financeira? Então leia este artigo sobre o assunto!